Sentiu um puxar invadir-lhe o peito e isso o despertou do sono. Não soube pensar se sonhava, mas sentiu o arranque de um lugar do qual não sabia e que o transportava de volta a sua cama. O lençol enchardo de suor lhe dava a certeza de algo que não soube classificar como bom ou ruim. Recolocou a mão em seu peito e sentiu presente os três tubos transparentes que formavam o cateter e isso lhe trouxe paz e quase uma felicidade. Pelo menos felicidade o foi até constatar que não havia arrancado os tubos, mas por fim, relembrou o motivo deles estarem ali e não houve tempo suficiente de formular a idéia de uma alegria. Sentiu e não sentiu. Em 10 segundos despertos havia atravessado uma montanha-russa emocional e então o sonho veio nítido ao pensamento: nele, o dia estava sol e olhava para a janela enquanto um bando de passarinhos alçavam vôo. E só. Seus sonhos não eram muito extensos como os das pessoas que conhecia. Na verdade, ele nunca sonhava algo roteirizado, era sempre uma lembrança única, como se a ânsia de acordar lhe deixasse apenas o trecho final da história no pensamento.
Lembrou da promessa da mãe e então esticou a mão ao lado do criado-mudo onde encontrava-se seu termômetro digital. Olhou para o aparelho como se pedisse um favor imenso, como se o termômetro pudesse lhe dar uma trégua conforme havia dado durante toda a última semana. Ligou-o e o pôs embaixo da axila direita e acompanhou, quase sem fôlego, o sinal sonoro que partiria dele, concedendo-lhe o passe-livre para conhecer a praia.
Enquanto esperava, sentiu os passos da mãe, que vinha da cozinha, aproximar-se do quarto e então ele lembrou do lençol encharcado de suor. Precisava livrar-se dele pois sua mãe, chata como era, julgava qualquer improviso como um sinal negativo as vontade dele. Entao ele enrolou-o e o colocou aos pés da cama, simulando que durante o sono, o havia deixado lá.
Simultâneo a mãe que entrava no quarto, o termômetro apitou e sem qualquer cerimônia, ela o tirou do menino. Ele não se mexia. Ele não respirava. Ele só ordenava o pensamento “36,5° por favor...” e a confirmação deu-se pelo sorriso da mãe.
- Já arrumou a mochila? Não podemos pegar o sol do meio dia.
O menino sorriu. Agora sim, ele sabia que era felicidade.
segunda-feira, 21 de março de 2011
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